sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

PROF. DR. JORGE RIOS DÁ PRECIOSAS DICAS PARA QUEM VAI ESTUDAR NO EXTERIOR


Algumas lições básicas para quem vai estudar no exterior 


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Algumas lições básicas para quem vai estudar no exterior 
 
Fonte : Jornal da ABES - RIO.
 
Tendo estagiado por diversas vezes em países do continente africano e europeu - seja como engenheiro no LNEC, em Lisboa, no Hydraulics Research, em Wallingford e nos Laboratórios de Hidráulica no Porto, Chatou, Delft, Luanda e Maputo, ou ainda como professor nas Universidades de Grenoble, Lisboa, Porto, Coimbra e Braga - o eng. Jorge Paes Rios, muitas vezes, foi procurado por pessoas, geralmente ex-alunos, que desejavam saber informações e detalhes sobre bolsas de estudos e estágios no exterior, ou simplesmente "dicas" de ordem técnica, cultural e social. Antes de relatar suas "aventuras", o engenheiro esclarece que cada experiência é muito particular, tendo em vista as condições de cada indivíduo e, também, as características da bolsa de estudos. Todavia, aí vão algumas informações oportunas:

1 - Escolha da especialização: Essa é a decisão mais importante. Deve-se partir do pressuposto que o candidato a bolsista (ou bolseiro, se for em Portugal) saiba quais os assuntos deseja dominar, o que nem sempre acontece. Além disso, o conhecimento da língua inglesa, em qualquer um dos casos - e se possível de outro idioma para contatos específicos -, é essencial. Esse conhecimento é condição sine qua non e deve ser o mais fluente possível, pois diversas dificuldades de origem acadêmica, ou simplesmente práticas, poderão dificultar a vida do bolsista.
 
2 - Escolha de instituição: O próximo passo é a escolha da instituição, dentre os países que oferecem cursos específicos. Em hidráulica, os Estados Unidos, Portugal, França, Holanda e Rússia proporcionam bons cursos. Sem dúvida, os países que oferecem as melhores oportunidades em matéria de hidrologia e recursos hídricos são os Estados Unidos, Inglaterra, França, Itália e Hungria. Em saneamento, além dos Estados Unidos, França, Alemanha e Holanda, todos os países já mencionados anteriormente, possuem instituições de renome e nível de ensino e pesquisa comprovados, tais como o IST e o LNEC, em Lisboa; o IMG e a ENSH, em Grenoble; o LNH, em Chatou; o HR, em Wallingford; os Laboratórios de Delft e de Emerloord e a Escola de Hidrologia de Padova. Nessa fase, aconselha-se o candidato a procurar maiores informações no CNPq, nos respectivos consulados e, sobretudo, com pessoas que já conheçam as instituições.
 
3 - Obtenção da carta de aceitação: Feita a escolha, o candidato deverá entrar em contato com a instituição, a fim de obter todas as informações necessárias, além de uma "carta de aceitação". - ou documento similar - para que possa pleitear uma bolsa. A não ser que prefira utilizar o próprio "bolso", o que não deixa de ser uma opção.
 
4 - Como obter uma bolsa no exterior: Diversos pré-requisitos podem ser importantes: curriculum vitae adequado e satisfatório; conhecimento de língua estrangeira, título de mestrado ou doutorado, já realizado no Brasil (quando possível); pertencer ao corpo docente de uma universidade; estar vinculado a algum projeto importante na área específica de especialização etc. A bolsa pode ser obtida através de instituições brasileiras, ou estrangeiras, e as exigências também podem variar conforme o caso. No Brasil, o candidato deve procurar o CNPq, a CAPES e algumas entidades particulares. No exterior, as possibilidades regulam de acordo com o país e as informações detalhadas podem ser obtidas junto aos consulados. Em termos burocráticos, pode-se dizer que esta é a fase mais trabalhosa, na qual os conhecimentos pessoais são de grande utilidade. O famoso "jeitinho brasileiro" ou o "QI" podem auxiliar bastante. Mas cuidado! Em alguns países, esse tipo de ajuda pode atrapalhar.
 
5 - Valor da bolsa e custo de vida: Ao conseguir a bolsa, e passado o entusiasmo, o bolsista passa a conviver com a dura realidade. O primeiro problema é o valor da bolsa, em relação ao custo de vida no país de destino. Alguns viajam como verdadeiros "marajás". Certas bolsas atingem valores tão altos que, além de não completar o curso, o "bolsista-marajá" retorna ao Brasil com dinheiro suficiente para comprar um apartamento na Barra da Tijuca. São raras exceções, mas existem. Será que ainda é assim? A regra geral é a bolsa de "bóia-fria", isto é, aquela que pode significar um "cobertor curto": paga-se o aluguel ou a calefação no rigoroso inverno europeu. Verifique, portanto, o valor da bolsa, sempre com base no custo de vida local, evitando as comparações com o Brasil. Previna-se com uma reserva razoável ou com alguma bolsa suplementar, caso contrário, o sufoco pode ser grande.
 
6 - Ajuda do consulado brasileiro: Uma boa "dica" para quem vai para o exterior é procurar, logo na chegada, o consulado brasileiro. Apesar de algumas queixas, o consulado pode ser útil para os contatos em geral, informações locais, aluguel de apartamentos, legislação do país e, até mesmo para se conseguir uma vaga no próximo avião da Varig, em casos de emergência. O eng. Jorge Rios, por exemplo, tem uma experiência positiva nesse sentido: ao alugar um apartamento de um funcionário do próprio consulado, em Lisboa, sua bolsa do CNPq (atenção! cuidado!) atrasou por três meses. O CNPq responsabilizava o Banco Central que, por sua vez, transferia o problema para a Universidade que, como não poderia deixar de ser, culpava o CNPq e assim por diante. Ele ainda estaria nessa "ciranda financeira", com o dinheiro da bolsa aplicado no overnight, se não fosse um telex enérgico e diplomaticamente malcriado do cônsul brasileiro, em Marseille.
 
7 - Atraso no pagamento das bolsas: Se a bolsa for concedida por uma instituição que não apresenta problemas burocráticos, os atrasos não deverão ocorrer, caso contrário... boa sorte!
 
8 - Alimentação no exterior: Estudante que se preza come mesmo é no "bandeijão"que é igual em qualquer lugar do mundo. Em Portugal, Jorge Rios engordou 10 quilos, mas não foi por causa da boa qualidade da comida do "bandeijão". A Pastelaria Suíça, no Rossio, ficava exatamente no caminho de sua casa... bem, quase no caminho... era um pouquinho distante. Todavia, para compensar, na França ele perdeu os 10 quilos. O que "salvava a pátria" (francesa, é claro) eram os queijos e vinhos que, apesar de nacionais, eram mais baratos do que a coca-cola.
 
9 - As pragas: Atenção bolsistas! Benetton, C&A e Mc Donald's são pragas mundiais. Evite-as, se puder!
 
10 - Moradia: As moradias variam muito, de acordo com o local e a época do ano. Em alguns países, pode ser fácil conseguir uma vaga em alojamentos universitários para solteiros ou casados. Uma regra é essencial: procure, antecipadamente, o maior número de informações para não passar "sufocos". Nesses casos, as melhores informações são das pessoas que viveram recentemente no local. Nunca aceite conselhos de turistas ou do consulado estrangeiro no Brasil. O bolsista pode se dar mal. Nunca viaje levando família inteira, a não ser que haja condições satisfatórias para pagar um hotel por tempo indeterminado.
 
11 - Namoro no exterior: Sem maiores comentários...
 
12 - Transportes urbanos: em alguns países, o transporte individual está tão desenvolvido que as opções pelos transportes coletivos podem criar problemas sérios, sobretudo se o bolsista for obrigado a caminhar grandes distancias ou esperar por um ônibus, ou trem suburbano, em pleno inverno europeu. O melhor é verificar as distancias e os possíveis trajetos de casa para o trabalho. Dependendo da bolsa, a solução pode ser o automóvel ou o transporte solidário.
 
13 - Gírias e supermercados: Mesmo que o bolsista fale fluentemente o idioma local, ainda há muito o que aprender. As gírias, sobretudo aquelas chamadas "acadêmicas", são normalmente utilizadas entre estudantes e professores. Os "termos técnicos" dos supermercados também podem ser uma novidade. Mesmo em Portugal, uma estudante conseguiu coletar, sem grandes esforços, cerca de 500 palavras e expressões não utilizadas ou incomuns no Brasil. Felizmente, hoje existe um dicionário lusobrasileiro para os mais parvos. Além disso, o famoso "plim-plim" já chegou em além-mar, o que faz com que os gajos assimilem alguma coisa do linguajar "global" ... a Globo 90 é nota 100... ora pois, que confusão!

 
14 - Conselho acadêmico: Não há outro: o esforço acima de tudo.
 
15 - Turismo também é cultura: A título de orientação, aí vai uma constatação: o turismo é incompatível com a vida acadêmica, principalmente durante o período de aulas e provas. Felizmente, isso só ocorre nessa época. Durante as férias e principalmente após o término do curso ou do estágio, se sobrar algum dinheiro, o bolsista não deve guardar nada. Aproveite! Nunca se sabe quando haverá uma outra oportunidade.
 
16 - Burocracia francesa: Os brasileiros que reclamam da burocracia no Brasil, não sabem o que é conviver com ela, na terra dos seus inventores. O mais grave é que o célebre "jeitinho", melhor arma contra a burocracia, ainda não foi descoberto na França. Para obter o registro definitivo na Faculdade, o infeliz bolsista precisa apresentar a carteira de permanência (carte de séjour), Por mais estranho que pareça, para obter a carteira de permanência é necessário a apresentação do registro definitivo. Durma com um barulho desses! A solução é tirar um registro provisório com antecedência. A principal "dica" para diminuir as peregrinações de um bolsista, é levar todos os documentos (todos mesmo!) já traduzidos no Brasil, por um tradutor juramentado, e com o carimbo do consulado francês. Na lista de documentos não podem ser esquecidos: certidão de nascimento, diploma universitário, exames médicos, declaração do órgão que está concedendo a bolsa, comprovante de vínculo empregatício etc. Em hipótese alguma, deixe a carteira de motorista vencer durante a estada na França. A carteira internacional não serve para nada, somente aquela expedida pelo DETRAN, órgão oficial no Brasil, é válida em qualquer circunstância. Mesmo com todos esses cuidados é bom prevenir, pois o bolsista pode demorar um mês e perder a calma na regularização da papelada. Cés sont les bureaux, mon cher!
 
17 - Trabalho no exterior: Pára um bolsista é praticamente impossível trabalhar em outro país. Primeiramente, por causa da absoluta falta de tempo. É preferível dedicar, integralmente, as horas ociosas aos estudos e à elaboração de teses. Outro aspecto importante, diz respeito a legislação internacional que, normalmente, não permite que estrangeiros exerçam funções remuneradas no país. Nesse caso, sobram os "empregos clandestinos", o que além de ser arriscado, é muito mal remunerado.
18 - Encontro com brasileiros: Encontrar brasileiros e brasileiras no exterior pode se tornar uma "faca de dois gumes". O lado positivo é a solidariedade que, nesses casos, sempre funciona; afinal, estão todos no mesmo "barco". As reuniões semanais devem ser organizadas para receber os novatos e transmitir-lhes as principais "dicas" da cidade e do país. Como todas as "dicas" são válidas em qualquer lugar do mundo, o eng. Jorge Rios e seus companheiros elaboraram uma apostila que era distribuída para os recémchegados. Além disso, vale a pena promover reuniões sociais e a tradicional "pelada" semanal. O lado negativo, fica por conta daqueles que esquecem que estão num país estrangeiro e exageram no convívio com os brasileiros. Para servir como exemplo, vale mencionar o caso de Grenoble, onde duas brasileiras, de Fortaleza, não conseguiram aprender uma só palavra de francês durante os seis meses que permaneceram na cidade. Alguns bolsistas se isolam de tal maneira, que não chegam a conhecer a cultura local. Outro perigo diz respeito àqueles que resolvem adotar a tese "gersiniana" como norma de vida: estão sempre procurando levar vantagem em tudo, certo?
 
19 - Encontro com os nativos: Dependendo da bolsa, os encontros e desencontros com a cultura local e as pessoas, podem estar repletos de surpresas agradáveis e desagradáveis. Os portugueses, belgas e italianos podem ser muito calorosos e receptivos com os estrangeiros, principalmente com brasileiros. Os franceses, por sua vez, são extremamente reservados, enquanto os alemães e escandinavos são indiferentes, ou até mesmo hostis, dependendo da cor da pele, cabelos e olhos do "invasor". Vale recomendar a leitura do livro "Cabeça de Turco", do escritor alemão G. Wallraff, para que o bolsista compreenda um pouco o racismo existente na Europa, muitas vezes velado, mas bastante violento com os povos subdesenvolvidos de maneira geral. As situações podem variar de acordo com o local, mas é bom ficar atento. Tipos negros, mulatos, morenos, árabes, turcos é outros, podem enfrentar situações constrangedoras:
 
Situação n° 1 - Em certa ocasião, um cidadão de Barbacena foi retirado de um bar na Suécia, em cuja porta havia uma placa: "Não aceitamos árabes nem cachorros".
Situação n° 2 - Em Portugal, os brasileiros são obrigados a recusar convites para o jantar, simplesmente porque a agenda está completamente lotada. Na França, as coisas são bem diferentes...
Situação n° 3 - O encontro com a cultura nativa pode gerar uma série de equívocos e peripécias. Ao alugar uma casa na França, o eng. Jorge Rios deparou-se com uma situação inusitada: no preço do aluguel estava incluído o trabalho de uma arrumadeira (espécie de caseira) que utilizava o telefone para falar com seus amigos, das cidades mais longínquas da França, e ainda carregava a metade dos mantimentos comprados pelo engenheiro. O marido da arrumadeira, por incrível que pareça, era da polícia. Resultado: Jorge Rios mudou de casa.
Situação n° 4 - Em certa ocasião, um conhecido cientista, professor de uma Universidade, convidou o eng. Jorge Rios para passar o Natal em sua casa, um castelo recém adquirido, juntamente com um grupo de refugiados vietnamitas. O famoso cientista considerava o "máximo da caridade cristã" cear, uma vez por ano, com o grupo, como se os vietnamitas não se alimentassem os 364 dias restantes. Resultado: Jorge Rios recusou o filantrópico convite.
Situação nº 5 - Na França, uma assistente social, conhecendo as dificuldades do engenheiro em conseguir moradia, aconselhou-o a se apresentar como refugiado político, para os quais são concedidas certas prioridades e uma série de vantagens. A moça só esqueceu um pequeno detalhe: o único comprovante de rendimento do engenheiro era a bolsa do governo brasileiro. Aliás, como há assistentes sociais na França!
Situação nº 6 - Certa ocasião, o eng. Jorge Rios foi convocado pela professora de seu filho para que comparecesse com certa urgência na escola. Pasmem: o garoto estava introduzindo o mau hábito de escovar os dentes após o almoço.
Situação n° 7- Em outra oportunidade, na Holanda, um cidadão brasileiro foi investigado severamente pela vigilância sanitária, em virtude de uma denúncia feita pela proprietária do prédio onde ele morava. Motivo: a senhora estava temerosa que o rapaz fosse portador de alguma doença grave na pele, já que tomava banho todos os dias.
Situação n° 8 - A sauna mista da Universidade de Grenoble faz o maior sucesso entre os brasileiros. O traje é o tradicional "nu e ao vivo". Os latino-americanos vão às sextas-feiras, mas sempre tendo o cuidado de proibir que as esposas freqüentem um lugar tão promíscuo. O lado positivo fica por conta do surgimento de ótimas e duradouras amizades.
 
20 - Arrumando as malas: O bolsista deve levar o que puder e tudo aquilo que considerar de grande utilidade. Mas não exagere! Evite as coisas inúteis. Quase tudo no exterior é bem caro. O bolsista não deve esquecer que vai pagar em dólar. Roupas de inverno e sapatos especiais para a neve são mais baratos no Brasil. O manual do CNPq (ainda não lançado) recomenda que o bolsista leve panelas, pratos e talheres. Isso, na verdade, é inútil. Além do peso, muitas vezes o bolsista ou estagiário consegue alugar apartamentos mobiliados. Na hora de voltar, não convém trazer excesso de bagagem. O bolsista deve procurar despachar tudo pelos Correios, principalmente os livros que pesam muito e gozam de tarifas mais baixas.

 
Boa sorte e boa viagem!
 


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